Olá amigos do HFPB. No último dia 01 de julho de 2021, foi comemorada uma data muito especial para a cidade de Alagoa Grande e para a história ferroviária paraibana como um todo. Há 120 anos, era inaugurado o trecho correspondente entre a então povoação de Mulungu até Alagoa Grande, trecho este de 24 quilômetros. Um sonho que vinha desde antes mesmo da implantação do primeiro trilho em solo paraibano.
De acordo com o Relatório do Governo Federal de Viação e Obras Públicas do Governo Federal de 1901 que traz o seguinte:
"Após o contracto celebrado em 22 de janeiro de 1900 entre o Governo e a companhia Conde D’Eu Railway para a conclusão e trafego do trecho de Mulungú até Alagôa Grande, a mesma companhia submetteu à consideração deste Ministério o orçamento das despesas a fazer com as obras, orçamento este que foi approvado pelo decreto n.3856, de 15 de dezembro de 1900, posteriormente rectificado pelo de n. 3984, de 2 de abril ultimo. A rectificação constituiu, não só no algarismo do orçamento que, em vez de 221:809$900, como por erro de copia sahira no primeiro dos ditos decretos, é de 521:809$900, segundo consta do original, organisado pela companhia acceito pelo Governo, como definitivamente estabelecida, como base para a convensão em ouro das despezas feitas em moeda nacional, a taxa cambial do ultimo dia de cada mez.
Os trabalhos da linha tiveram começo a 6 de julho de 1900, sendo empregados nos mesmos trabalhos operarios sertanejos, em numero de 400 homens.
Innegavelmente a autorisação para a conclusão das obras e trafego do trecho de Mulungú a Alagôa Grande, dada no art. 25, lettra E da lei n. 560, de 31 de dezembro de 1898, consultou verdadeiras conveniencias publicas, pois que aquelle trecho, além de destinar-se, ao desenvolvimento da fertil zona que atravessa, facilitando assim a exportação dos productos que não são alli consumidos, trouxe ainda como resultado aproveitar-se os materiaes da extencta estrada Timbaúba ao Pilar, que iam sendo estragados pela acção do tempo e, além disto, deu serviço e meios de subsistencia a grande numero de retirantes que, forçados pelo instincto de conservação quando a secca devastava os sertões, procuravam a zona dos brejos onde desta vez conseguiram encontrar, no serviço do trecho, o pão de que careciam para si e sua familias.
O traçado observado no trecho é o que foi approvado pelo decreto . 69 de 21 de março de 1891, e o orçamento respectivo é o que foi também approvado pelos indicados decretos ns. 3856 e 3984, de 16 de dezembro de 1900 e 2 de abril d'este anno.
A companhia atacou os trabalhos em toda a extensão da linha. As obras de arte projectadas constam de 4 pontes, 11 pontilhões, 17 boeiros capeados, e 34 boeiros abertos. Além de 1 ponte de 6 metros de vão, 2 pontilhões, 3 boeiros capeados e 17 boeiros abertos, que já estavam construidos, a Companhia já terminou 2 pontes, 1 pontilhão, 9 boeiros capeados, 8 boeiros abertos, 2 boeiros de bocca de córte, 1 mata-burro além de um pontilhão de 4 metros de vão, cujas fundações a mesma Companhia achou preparadas. A obra de arte mais importante do trecho é a ponte de 18m,70 sobre o rio Zumby locada á estaca 718X10, cujos alicerces foram construidos pela antiga Central da Parahyba. A alvenaria dos encontros desta ponte foi iniciada em janeiro findo.
Em 31 de dezembro as obras da Via-permanente estavam no kilometro 9.
Começou em janeiro passado o esticamento do fio telegraphico. Os postes tinham sido fincados durante as obras da antiga Estrada de Ferro Central da Parahyba.
Nos mezes de junho a outubro de 1900 a Companhia havia despendido 121:940$930 com obras, constantes do seguinte quadro:
SERVIÇO GERAL
1. Ao Engenheiro-fiscal . . . . . . . . . 6:000$000
2. Honorarios do engenheiro-chefe e
do pessoal do escriptorio central de construção . . . 11:003$960
3. Despeza diversas . . . . . . . . . . . 4:943$568
4. > de escriptorio . . . . . . . . 348$754
5. Impressos . . . . . . . . . . . . . . 600$567
6. Mobilia instrumentos e utensilios . . . . 1:437$664
Pessoal e despezas diversas . . . . . . . . 24:334$513
7. Honorario do pessoal de campo . . . . . . 8:350$824
8. Gratificações, e ajudas de custo, diversos . . 2:237$614
9. Despezas de escriptorios . . . . . . . . . . 62$246
10. Mobilia, instrumentos e outros objectos . . . . 725$101 11:375$793
...Entre os principaes serviços, durante o anno, figura a montagem do metarial rodante adquirido pela companhia para trafegar o ramal de Mulungu a Alagôa Grande, a saber:
Locomotiva denominada "Alagôa Grande", de n. 15, com quatro
rodas motrizes de 1 m, 06 de diametro e dois limpa-trilhos . . . 1
Carro de 1° classe com accommodações para 35 pessoas e assentos
de palhinha, dotado de W.C., lavatorios e accessorios . . . 1
Ditos de 2° classe para accommodar 42 pessoas em bancos
longitudenaes, com W.C. e lavatorios . . . . . . . . . 2
Wagons cobertos . . . . . . . . . . . . . . . . . . 10
Ditos, abertos, para transporte de cargas e lastro . . . . 5
Todo este progresso chegando a cidade se deve fundamentalmente a um homem, tratava-se do Deputado Federal patoense radicado em Alagoa Grande, Apolônio Zenaide Peregrino de Albuquerque Montenegro, que na época era chefe político local. o referido Deputado Federal tinha uma grande reivindicação junto ao governo federal: trazer em sua terra a estrada de ferro. Através de muita luta, enfim o referido deputado junto ao Governo Federal conseguiu enfim trazer a ferrovia a Alagoa Grande.
O dia tão esperado chegou, 1 de julho de 1901, uma locomotiva inglesa denominada “Alagoa Grande”, de número 15, chegava “bufando” e com seu tradicional e estridente apito, pela primeira vez a Alagoa Grande. Com absoluta certeza, todo aquele acontecimento glorioso deve ter agitado a população da urbe na época, já que pela primeira vez recebia o "bicho de ferro soltando fumaça pelas ventas".
Foram realmente tempos gloriosos. A partir de então um verdadeiro surto de crescimento nos âmbitos social, cultural e econômico “apitava” na terra da “Lagoa do Paó”. Na primeira metade do século XX muitos serviços nas mais variados tipos chegou à Alagoa Grande nunca antes experimentado. Sendo este um dos municípios mais prósperos de toda a Paraíba durante décadas.
A prédio da estação, concluída apenas no ano seguinte, ou seja, em 1902, construída com um andar superior afim de abrigar o Chefe da Estação, seguia as linhas simples de volumetria com ampla cobertura de sua plataforma, a fim de atender melhor os transeuntes. Esta construção já se deu quando a Conde D'Eu foi encampada pela Great Western of Brazil Railway (GWBR), entre 1901 e 1902.
Anos mais tarde foi construída a parada de Bastiões e Capim, afim de transportar passageiros das áreas rurais do município.
Na década de 1920, o então Governo Federal tinha o objetivo de estender o ramal em direção até o Sertão do estado partindo de Alagoa Grande, algumas obras foram realizadas entre Alagoa Grande e Alagoa Nova, como pontes, aterros, bueiros, e até o início da escavação do grande Túnel da Serra da Beatriz. Porém o laudo do General Rondon inviabilizando a obra, já que excluía a importante cidade de Campina Grande da trajetória e a paralisação de todas as obras da Inspectoria Federal de Obras Contra as Seccas (IFOCS) entre 1922/23, o ramal não seguiu em frente.
Porém, para a tristeza de todos em fins de 1966 o tráfego ferroviário entre Mulungu e Alagoa Grande foi interrompido por ordem do Governo Federal, do Ministro de Viação Juarez Távora. Esta decisão equivocada deixou em segundo plano as ferrovias deste país, o qual proporcionava meios de transportes mais baratos do que as rodovias que estava sendo priorizadas.
Esta trágica decisão tirou este benefício para o povo alagoa-grandense definitivamente, não voltando mais. Todo o material de trilhos, dormentes entre outros foram retirados. A estação foi totalmente esquecida e abandonada.
Encontra-se atualmente em estado deplorável e em total abandono, não remetendo as época douradas da ferrovia na cidade. Aguarda na esperança de algum dia seja totalmente restaurada, servindo, quem sabe, de algum museu contando um pouco da riquíssima história de Alagoa Grande.
Fontes: Relatórios do Governo Federal de Viação e Obras Públicas – 1901 e 1902.
Alagoa Grande, Sua História, José Avelar Freire, 2° Edição, 1998.
O Malho, setembro de 1922.
Registro de uma das últimas viagens do trem a vapor em Alagoa Grande no ano de 1966. Fonte: Alagoa Grande, Sua História, José Avelar Freire, 2° Edição, 1998
Ramal Mulungu a Alagoa Grande, trecho de 24 quilômetros por via férrea. Montagem feita a partir da junção de dois mapas dos municípios de alagoa Grande e Guarabira. Fonte: Enciclopédia dos Municípios Brasileiro, Vol. IV, IBGE, 1959.
Estação e armazém de Alagoa Grande em 1922, nas obras do prolongamento do "Ramal de Penetração". Fonte: O Malho, setembro de 1922.
Aspecto da construção de um pontilhão (Ponte T) nas proximidades da estação de Alagoa Grande em 1922. Fonte: O Malho, setembro de 1922.